segunda-feira, julho 18, 2005

Kit maravilha

Tenho cá a sensação que as máquinas também devem ter o seu coração. Cheio de óleo é certo, mas com um peculiar bombear de emoções. É muito estranho um carro manifestar-se assim de repente. Nos últimos seis anos nunca aquela viatura deu problemas e agora, sem ninguém o esperar, armou-se em parvo. Claro que lhe tenho mudado o óleo, dou-lhe água de quando em vez e levo-o à garagem do meu querido amigo Quim para lhe fazer as análises necessárias. Não o lavo muitas vezes, é verdade, mas também não é daqueles que cheiram mal.
Até então, o maior problema que tive, foi há pouco tempo, quando estava eu a piscar o olho a uma garina sueca, quando lhe caiu o escape. Até me levou a comentar:
“O carro deve ter lepra!”
Mas não. Pelo que o Quim disse, e sabe-se a tendência que o homem tem para o exagero, foi a válvula disto e daquilo, as pastilhas dali e dalioutro e mais a saída de não sei o quê?
“Isto agora...”
A conta deixou-me de cabelos em pé, além de descobrir que o Quim, que não sabe dizer o raio duma frase sem pelo menos um foda-se e uma merda, ganha mais numa hora que eu num dia. Mais o Iva, que agora é 21% e valha-nos Deus pelo que ainda aí vem. Bem dizia a minha avó, que Deus ainda não tem: “Se quiseres muito tens de sujar as mãos.”
Mas para mim a causa de tanto estrago foi o ciúme. A minha sobrinha e a atenção que mereceu provocou-lhe a dor e para chamar a atenção tratou logo de se disfuncionalizar nas válvulas, pastilhas e sei lá que mais.
Eu e a Melissa não lhe percebemos a atitude. É que dias antes demos-lhe banho, aspirámo-lo e mudamos-lhe os pneus dianteiros.
“Os carros são como as mulheres, quanto mais um gajo lhes dá, mais querem.”
Enfim. Por causa da cena de ciúmes, fiquei descapitalizado até ao fim do mês. Por isso transformei-me num agorafóbico e só saio de casa mediante a condição de não gastar dinheiro nenhum.
Ontem, estava eu, claro, em casa a ver um jogo já antigo do Benfica, de 1961 na RTP Memória, quando ganhámos a primeira Taça dos Campeões ao Barcelona, quando me deu um súbito benfiquismo ao ver o Coluna, o Águas e o Augusto. A emoção foi tanta que até pareceu estar a ver o jogo em directo. Gritei cada golo como se os heróis estivessem a jogar no momento. Se não fosse o raio da despesa do carro ainda comprava o Kit. Juro que comprava, mas agora o carro estragou tudo.
“Melissa, posso comprar o Kit Benfica?”
“Deves tar a brincar, não?”
“É que dá descontos. Nem sabes o dinheirão que um gajo poupa.”