terça-feira, julho 26, 2005

Jogging 1

Desde que o Verão começou e os dias ficaram mais compridos, voltei a dedicar-me à sempre estimulante prática desportiva. Como estou impedido pela sociedade de praticar desportos de equipa, essencialmente porque, até hoje, nunca ninguém demonstrou uma sincera vontade de me ter no seu grupo, sou forçado a competir comigo próprio no misantrópico Jogging. Andar a correr, sozinho, dum lado para o outro, ao contrário do que possa parecer, tem em mim um efeito bastante estimulante e encorajador. Além de me formar o carácter, tonifica-me os músculos das pernas que, bem entendido, servem como efeito dissuasor para os cães que têm uma secreta tendência para ladrar à minha passagem.
O acto de correr só tem sentido se se tiver um objectivo. Para mim esse objectivo é superar o tempo da corrida anterior. Se ontem corri, por exemplo, 5 minutos, amanhã terei de correr 7 e depois 10. Com o intuito de passar o tempo da melhor maneira, entrego-me à demência de comentar mentalmente a minha prestação atlética.
Através deste excitante e inovador sistema mental, consigo ter sempre alguma coisa em que pensar. Devido a isso consegui, em tempos idos, permanecer em marcha de corrida cerca de duas horas. Não é de estranhar, portanto, que muita gente me apanhe por vezes a falar sozinho enquanto corro.
“Hoje temos aqui para fazer o comentário da corrida, Carlos Lopes que nos vai dizer como se está a portar Hugo Carvalho, numa altura em que só faltam dez minutos para bater o seu anterior record...”
“Tenho que admitir que me está a surpreender a capacidade física do atleta, tendo em conta que foi pagar a conta da água e que para o fazer teve de andar cerca de 700 metros na ida e na volta, sendo que a ida era a subir. Ainda para mais, devido a esse afazer, não conseguiu lugar sentado no comboio e esteve a viagem toda de pé. São contrariedades que, como se vê, ele está a conseguir superar magistralmente. É um herói.”
Quando não alcanço o objectivo a que me proponho, as vozes mentais vão o caminho de regresso a chamar-me nomes e a desprezar-me por ser tão patético. A tal ponto que fico deprimido e deixo de comer.
“Foi uma página negra no atletismo. Hugo Carvalho mostrou-se um ser tão desprezível que em alguns momentos da corrida senti pena dele. É um ser fraco e sem capacidade atlética que envergonha a espécie humana e que faz perder tempo a quem realmente se predispõe a ver desporto a sério.”

segunda-feira, julho 25, 2005

Jogging 2

O sítio onde eu moro, junto à praia, é ideal para a prática do Jogging. Uma pessoa pode correr, toda contente, a ver o mar, as rochas, os barcos e o pôr do sol. É um quadro bem idílico, não haja dúvida, e são muitos os que, tal como eu, partilham o gosto dos desportos individuais e se deslocam até ao paredão, recentemente remodelado, para mostrar os seus dotes atléticos.
Por alturas da época balnear, as esplanadas enchem-se de estrangeiras de cabelo loiro que se sentam nas mesas sozinhas para aproveitar o calor e as férias neste querido país, entregando-se ao descanso da atarefada vida urbana. Claro que, uma vez na esplanada precisam dum entretenimento merecedor da sua atenção, sendo a actividade principal espiar quem passa. Como parece evidente, aos seus olhos atentos, sobressaem de entre os transeuntes, os verdadeiros atletas, aqueles que pela sua constituição física as fazem suspirar e beber um belo trago de cerveja fresquinha. A fama do Camarinha já é mundial e em Lisboa, não tendo o gato, caça-se o rato.
Portanto, para mim, incapaz de competir com os ratos que correm nestas paragens, com o dobro do meu tamanho e da minha largura, tento não ficar mal na fotografia e esforço-me por, acima de tudo, não dar muito nas vistas mostrando-me, contudo, o suficiente para que elas saibam que estou lá.
“A pista está cheia de adeptos para verem Hugo Carvalho numa nova tentativa de bater o seu Record de 15 minutos. Vamos lá ver se o choque que levou, ao tentar concertar um problema eléctrico em casa, vai influenciar negativamente o resultado final. Diga-se de passagem que a namorada se fartou de barafustar depois do acidente e é provável que o atleta não esteja psicologicamente a 100%.”
Não posso negar que gosto de espreitar as loiras na esplanada quando por elas passo no meu passo de corrida. Dou uma vista de olhos. Nada de extraordinário. Não viro a cabeça como muitos que por lá andam, nem sequer assobio, apesar de elas expulsarem das feições um sorriso sincero aos piropos dos mais descarados, mas faço uma cordial apreciação preliminar.
O problema de haver muitas esplanadas no local de treino é que uma pessoa não pode desistir de correr a qualquer momento. Muitas vezes houve em que, morto de cansaço e com dilacerantes dores no estômago, me mantive de pé, de peito inchado só para que as loiras estrangeiras não me vissem a desistir. Isso não. Não gosto de ser um homem marcado. Prefiro cair para o lado do que desistir em frente a uma esplanada.
“Hugo Carvalho continua a sua corrida magistral e prepara-se para entrar no campo de visão da loira mamalhuda da camisa de alças verdes, que aliás tem sido uma presença assídua nestas paragens nos últimos dias. Ela aproveita esta altura de menor interesse para olhar o empregado e pedir mais uma bebida. As suspeitas confirmam-se, o motivo da sua assiduidade neste espaço comercial não é, infelizmente, o nosso atleta!”
Apesar de tudo gosto de correr. Normalmente consigo sempre superar-me e facilmente vou ultrapassando os feitos anteriores. O meu passo de corrida é sempre o mesmo e não entro em grandes velocidades, apesar de quando passo pela mamalhuda da camisa de alças verde acelero um pouco mais, esperando que ela me siga com o olhar até me perder de vista.
“Ò caixa de óculos (eu), vestiste os calções ao contrário.” (esplanada em delírio)
A vida não é perfeita, toda a gente me diz isso, mas também é escusado ser assim tão cruel. Vou começar a ir aos domingos à missa.
“Então amor, hoje não comeste nada. Tás doente ou quê? Não gostas do meu comer é isso? Pois então habitua-te a ele, porque se não gostares tens bom remédio, pegas na panela e fá-lo tu.”

quinta-feira, julho 21, 2005

Adriana

Finalmente tive a soberana oportunidade de estar a sós com a minha sobrinha, a querida e adorada Adriana que cada vez está mais fofa, isto apesar de ainda não falar nem andar, mas que, apesar de tudo, já se consegue mexer e mostrar o sorriso lindo cada vez que vê o tio.
As expectativas eram grandes. A minha irmã ia-se pirar o dia todo com o meu cunhado, e como não tinha mais ninguém disponível para cuidar da Sra. Adriana, lá me teve de entregar, a custo, os cuidados da preciosa criatura. Eu sei que fui a última opção, mas como diz o provérbio Hitita “O derradeiro tem o olhar mais brilhante.”
Os meu planos eram grandiosos. Fazer-lhe cócegas nos pés, ensinar-lhe a pintar castelos e damas de corte e dançar vertiginosamente a dança do ventre para ela ficar desperta: “Olha o tio! Olha o tio a dançar a dança das indianas!”
A minha irmã chegou cheia de pressa, com a bebé toda contente por ter a consciência que iria passar um dia agradável com o tio.
“Quem é a bebé mais querida quem é? Olha a bebé mais linda!”
A pequenina Adriana lá abanava os pés e as mãos de felicidade que até me fez lembrar o Ricardo a sair dos postes.
“Isto é o quê? Não sei se já te apercebeste, mas a tua sobrinha tem 2 meses. Ela não vai conseguir fazer esses puzzles que aí tens. Ai meu Deus! Ela nem se consegue sentar quanto mais tocar nesse piano. Ai meu Deus! Isto é o quê? Xadrez? Queres jogar Xadrez com a miúda? Tás a gozar comigo ou passou-te mesmo essa ideia pela cabeça? Ai meu Deus!”
Isto é o mal de ser mãe antes de chegar aos trinta. Não conseguem ter presente a eventualidade da criança ser sobredotada como eu. Se a minha mãe tivesse a capacidade de se aperceber dos sinais que eu já evidenciava no berço, a esta hora estava na Nasa a inventar qualquer coisa importante. Sendo assim, devido à negligência, a minha potência intelectual como não foi acarinhada e devidamente incentivada, regrediu até se transformar numa massa disforme capaz de, apenas, produzir este amontoado de parvoíces a que chamam blog.
Seja como for, estava deserto que a minha irmã se fosse embora para começar a interagir com a criança. Primeiro vou-lhe ler o primeiro capítulo da Pedra Filosofal do Harry Potter que é fixe para os miúdos. Vou ensiná-la a mexer os dedos e tocar piano e desenvolver o intelecto com o Lego e os puzzles. Talvez a leve ao jardim para rebolar na relva. É pena ainda não ter idade para me fazer companhia nuns caracóis. Aluguei o Nemo para ela ver e se ainda houver tempo ensino-a a pintar.
“Primeiro deixa-a dormir. Quando ela acordar, daqui a três horas e meia dá-lhe o Biberon, segues as instruções para os dois meses. Depois pegas nela e fá-la arrotar, não é preciso grande coisa, basta pegar nela e dar-lhe algumas pancadinhas nas costas. Depois disso tens 10 minutos para fazeres as tuas macacadas, que é o tempo em que está acordada. Se ela chorar dá-lhe a chucha, mas lava-a primeiro. Ela há-de adormecer. Se não pega-a ao colo e abana-a um bocado. Depois adormece. Três horas e meia depois acorda e repetes o processo. Se a fralda estiver suja troca-a. Basta lá pores o nariz para saberes. Segues as instruções da embalagem. Portanto, se tudo correr bem, ela vai ficar acordada meia hora até nós chegarmos em três fases de 10 minutos. Por favor, e isso é muito importante, não a forces a estar acordada. Se tudo falhar telefona. Mas mete uma coisa na cabeça. Se ela chorar, ou é porque tem sono ou porque tem fome. A vida dela é isto, dormir e chorar. Não tentes alterar o rumo da natureza. Eu já tentei e não consegui. Agora diz-me, o que é que os bebés como a Adriana fazem?”
“Comem e dormem.”
“Lindo menino. Realmente tinhas razão quando dizias que eras sobredotado.”

quarta-feira, julho 20, 2005

Agora, dorme...

Isto de ter a sobrinha em casa é muito bonito, mas é um tédio de morte. Ao contrário dos meus planos a santa criatura não faz companhia a ninguém e passa o tempo todo a chorar. Depois não é um choro normal, é estranho, não deita uma única lágrima. Preocupado, ainda telefonei à minha irmã:
“Olha lá, é normal a miúda estar a chorar e não deitar lágrimas?”
Nem sei porque me dei ao trabalho:
“Ai meu Deus!”
A vida de tio é uma seca. Um gajo passa a tarde sem fazer nenhum, ao lado da sobrinha que tem a seguinte rotina: Acorda, espreguiça-se durante um minuto, peida-se, ri-se e começa a chorar. Recebe o Biberon, arrota, ri-se e começa a chorar. Recebe a chucha acalma e adormece. Três horas depois faz o mesmo.
*Suspiro* Sim Senhor, bonita experiência esta de ser tio...
Mas não me fiquei, entre o repasto e o sono disse-lhe logo tudo o que tinha a dizer, não vá abrir precedentes e depois ainda terem a lata de me cuspirem à cara, mais tarde, que não sabiam do meu ressentimento:
“Continua assim que vais ver se recebes alguma coisa pelo Natal. Deves receber, deves.”
Mas não me fiquei apenas pelas ameaças. Como sou um homem com carácter, estilo Dias Ferreira, concretizei:
“Olha que quando eu não gosto das pessoas raramente volto a gostar.”
A delambida, cheia de lata, ainda por cima disfarçou não ouvir:
“Agora finges que dormes. És muito esperta tu! Só és esperta para o que te interessa. Se queres que te diga, posso muito bem tocar piano sozinho, fazer puzzles e pintar damas de corte sem ti. Fi-lo na minha infância e posso muito bem voltar a fazê-lo.”
*Monumental Amuo*

terça-feira, julho 19, 2005

Relógio biológico

Não bastando a azafama da minha experiência de alimentar e suportar a flatulência da minha querida e adorada sobrinha, chega-me a casa a minha querida e adorada namorada. Andava desesperada porque o carro foi para a garagem e a coisa tinha ares de custar uma fortuna. Além disso não sabia do guião que tinha de traduzir até ao dia seguinte.
“Viste o guião?”
“Sei lá onde tens isso.”
Continuou à procura. Em má altura o fez. Estava no momento de alimentar a bebé chorona, que, agora por acaso, estava mais calma e até parecia uma santa, tendo em conta o comportamento anterior.
“Tavas a dizer que a Adriana não se calava. Tá tão sossegada. És tão linda! Quem é a sobrinha da tia? Quem é? Gugugugugu. Quem é quem é Gugugugu!”
Não gosto nada desta cumplicidade feminina. De parvo é que eu não tenho nada. Fiz logo questão de acabar com os mimos:
“Olha lá, não estavas á procura do guião?”
Continuou dum lado para o outro à procura e sempre, sempre a perguntar:
“Mas não o viste mesmo, eu devia-o ter deixado para aí.”
Ora, a gritaria da Adriana e a incansável repetição da pergunta da Melissa fizeram-me pensar no meu papel de Pater Famílias no mundo e a certeza que, pelo menos para já, o melhor é gozar os momentos de liberdade, antes de deixar descendência. Não, até podem ser engraçados, mas dão um trabalho tão grande que o melhor é serem os outros a ter.
Foi então que a Melissa, com a Adriana ao colo, olhou-me nos olhos e disse:
“Só quero que saibas que tenho o relógio biológico completamente aos saltos.”

segunda-feira, julho 18, 2005

Kit maravilha

Tenho cá a sensação que as máquinas também devem ter o seu coração. Cheio de óleo é certo, mas com um peculiar bombear de emoções. É muito estranho um carro manifestar-se assim de repente. Nos últimos seis anos nunca aquela viatura deu problemas e agora, sem ninguém o esperar, armou-se em parvo. Claro que lhe tenho mudado o óleo, dou-lhe água de quando em vez e levo-o à garagem do meu querido amigo Quim para lhe fazer as análises necessárias. Não o lavo muitas vezes, é verdade, mas também não é daqueles que cheiram mal.
Até então, o maior problema que tive, foi há pouco tempo, quando estava eu a piscar o olho a uma garina sueca, quando lhe caiu o escape. Até me levou a comentar:
“O carro deve ter lepra!”
Mas não. Pelo que o Quim disse, e sabe-se a tendência que o homem tem para o exagero, foi a válvula disto e daquilo, as pastilhas dali e dalioutro e mais a saída de não sei o quê?
“Isto agora...”
A conta deixou-me de cabelos em pé, além de descobrir que o Quim, que não sabe dizer o raio duma frase sem pelo menos um foda-se e uma merda, ganha mais numa hora que eu num dia. Mais o Iva, que agora é 21% e valha-nos Deus pelo que ainda aí vem. Bem dizia a minha avó, que Deus ainda não tem: “Se quiseres muito tens de sujar as mãos.”
Mas para mim a causa de tanto estrago foi o ciúme. A minha sobrinha e a atenção que mereceu provocou-lhe a dor e para chamar a atenção tratou logo de se disfuncionalizar nas válvulas, pastilhas e sei lá que mais.
Eu e a Melissa não lhe percebemos a atitude. É que dias antes demos-lhe banho, aspirámo-lo e mudamos-lhe os pneus dianteiros.
“Os carros são como as mulheres, quanto mais um gajo lhes dá, mais querem.”
Enfim. Por causa da cena de ciúmes, fiquei descapitalizado até ao fim do mês. Por isso transformei-me num agorafóbico e só saio de casa mediante a condição de não gastar dinheiro nenhum.
Ontem, estava eu, claro, em casa a ver um jogo já antigo do Benfica, de 1961 na RTP Memória, quando ganhámos a primeira Taça dos Campeões ao Barcelona, quando me deu um súbito benfiquismo ao ver o Coluna, o Águas e o Augusto. A emoção foi tanta que até pareceu estar a ver o jogo em directo. Gritei cada golo como se os heróis estivessem a jogar no momento. Se não fosse o raio da despesa do carro ainda comprava o Kit. Juro que comprava, mas agora o carro estragou tudo.
“Melissa, posso comprar o Kit Benfica?”
“Deves tar a brincar, não?”
“É que dá descontos. Nem sabes o dinheirão que um gajo poupa.”

domingo, julho 17, 2005

Sopro

Tenho um tipo que vive no prédio ao lado do meu que é um autêntico imbecil, mas que tem a sorte do seu lado e conseguiu chegar a uma posição de destaque na função pública. Dizem as más línguas que foi o pai, deputado num partido de direita, que lhe proporcionou o emprego.
Seja como for, era frequente vê-lo na esplanada da praia todo inchado, a falar ao telefone com um tom altivo, a marcar reuniões e a fechar negócios. Como qualquer pessoa compreendia, o homem conseguia fazer duma conversa banal um negócio de milhões. O que lhe interessava sobretudo, era dar a entender aos frequentadores da esplanada, principalmente ás mulheres, que ele dominava o mundo e que o mundo o amava a ele.
Há coisa dum mês, com o aproximar das férias, mudou de assunto, mas não o tom de voz:
“É que eu não vou cá estar. Jantamos em Agosto. Vou para as Caraíbas. Vou lá dar uma volta, descansar. Há dois anos que não tenho férias. Sempre dum lado para o outro. Você sabe como é...”
Toda e qualquer conversa ia ter para o raio das Caraíbas, o que acabou por provocar um certo mal estar entre os frequentadores da esplanada:
“No final de Julho...sim, sim....vou para as Caraíbas. Vou lá ver aquilo. Vou estar num 5 estrelas e se tiver tempo vou ainda à Florida.”
Deixei de lá ir porque me chateava ver o homem quanto mais ouvi-lo. Mas ontem, como estava um calor desgraçado, decidi ir lá beber uma imperial.
Quando chego à esplanada estava lá o anormal a beber um Ginger Ale e, claro, ao telefone:
“Não...férias não vou ter, é que ia para as Caraíbas e assim tive de ficar por cá.”

quinta-feira, julho 14, 2005

Boa Sorte

Não vou negar que a minha vida ganha um dinamismo diferente cada vez que o jackpot do EuroMilhões atinge valores muito parecidos com o rendimento anual dum futebolista de topo. Não sei, sinto-me aliviado por ter a possibilidade de pensar sobre o assunto. Uma das vantagens deste novo jogo da santa casa é precisamente essa, fazer com que as pessoas pensem nas atitudes a tomar em caso de vitória. Parecendo que não, sempre ajuda a passar a sexta feira e, sem um gajo dar por isso, já são seis horas. Há aqueles tipos que aliviam o stress no ginásio eu, por outro lado, alivio as tensões a pensar no Jackpot.
Ainda hoje, apareceu um gajo ao balcão a reclamar:
“Isto é incrível, o senhor faz ideia de quanto tempo estou à espera desse tal despacho?...”
Se me saísse aquele dinheirão todo acho que não dizia nada a ninguém. Guardava segredo. Com a ladroagem que aí anda, ainda me raptavam alguém da família. Não, o mais acertado era ficar de boca fechada. Nem à minha mãe dizia. Desejosa que está em eu ser alguém na vida para impressionar as amigas, dava com a boca no trombone num instante. O melhor a fazer é dar o bom dia e a boa tarde aos vizinhos e pronto. Se, alguém mais metido me perguntar como é que vai a vida, respondo, vai bem muito obrigado, que é o que respondo sempre, mesmo quando algum infortúnio tomba sobre a minha existência.
“Isto é uma vergonha! Ando há 5 anos, 5 anos com este processo em tribunal e nunca mais me despacho! Até parece que estou enguiçado...”
Casas é que eu comprava na boa. É daqueles negócios que dá sempre dinheiro. No Algarve é que não. Não gosto. Preferia comprar no Alentejo, menos confusão, melhores praias, pessoas mais simpáticas, melhor comida. Sim. Depois comprava uma no Saldanha, de luxo, com divisões a dar com um pau, com vista sobre a praça. Comprava uma à minha irmã, outra à minha mãe e ao meu pai. Isso se quisessem, se não quisessem oferecia outra coisa qualquer. Se calhar comprava uma casa de campo, mas com a história dos fogos tenho medo, sabe-se lá o que pode acontecer.
“Mas posso falar aí com alguém para me apressar isto? O presidente? Onde está o Presidente? Eu sei que o senhor não tem culpa da situação, mas não se pode admitir uma coisas destas. É que o advogado não me fez nada, a única coisa que fez foi a panelinha com o gatuno do meu sócio e eu é que fiquei a arder em 3 mil contos...”
Dava também uma viagem pelo mundo. Mas ia de barco, que voar assusta-me. Um cruzeiro pelo mediterrâneo, ilhas gregas, Itália, dava um salto ao Nilo, ao Tigre. Eu, a Melissa e os velhos. Podia ir ao Japão que sempre foi o meu destino de sonho, aproveitava e ia Austrália.
“Diligências... diligências... Cada vez que eu cá venho tão em diligências. Não sei que diligências são essas que nunca mais acabam. Paciência já tenho eu muita. Eu para a semana, se não tiver o meu problema resolvido vou à SIC. Neste país as coisas só se resolvem quando se vai à televisão...”
À minha querida e adorada sobrinha é que já não sei o que lhe dar. Tão pequena e sem desejos nenhuns. Só dormir, comer, arrotar. Pouco mais faz. Tem tudo o que precisa para ser feliz. O que é que se pode dar a uma criança de dois meses? Só se lhe der uma cadeirinha vibratória para tar sempre a abanar. Bem, tou eu aqui a fazer contas mas não sei se ainda tenho de subtrair os impostos. Será?
“Bom fim de semana e veja lá se me dá uma mãozinha nisso para ser mais rápido...”
“Vá descansado que tudo se há-de resolver...”
...Se Deus quiser.

quarta-feira, julho 13, 2005

Big Apple

Já há algum tempo que tenho vindo a reparar que o vigor intelectual evidenciado nas primeiras conversas de namoro se veio a perder com o imensurável correr dos dias. Antigamente, uma singela refeição podia demorar horas, sempre nos melhores restaurantes e com um palavreado incessante, albergando um humor denso, tiradas de fina estirpe e observações de uma pertinência glorificante. Foram tempos em que cada dia era fruto duma ânsia de conhecer e de observar a verdade, comparável, apenas, a adrenalina sentida pelo Sr. Galileu quando inventou a sua geringonça ou à minha querida e adorada sobrinha Adriana quando me viu pela primeira vez.
Cinte das minhas obrigações enquanto futuro marido, não permito, com facilidade, que a vitalidade se extinga assim aos poucos. Baseado em artigos de revistas femininas que sempre servem para a alguma coisa, convidei-a para um jantar, um pouco mais carote que os habituais a que vamos. O objectivo era levá-la ao primeiro restaurante a que fomos para revivermos os momentos passados, mas como não me lembrava aonde tinha sido, fiquei-me por um que aprecio e que tem bifes cobertos em gordura.
Aviso já, para que não haja recurso a dúvidas, que o meu interesse pela leitura de revistas femininas vem da obsessão doentia que tenho em escrever um conto erótico para as mesmas. Quer dizer, já o escrevi, mas a resposta que recebi quando o enviei foi bastante cabal: “Você é um porco!” Nem mais nem menos uma palavra. Nem assinada vinha. Por isso, se algum dia um dos leitores tiver a ousadia de tentar o mesmo, fica com o meu conselho, não misture animais com sexo.
Começamos o tão promissor jantar e ela mostrou-se desde logo a sua sensibilidade feminina:
“Já pagaste a luz? Olha que deve estar quase a passar o prazo.”
“Sim. Hum!? Isto é que é um bife, raios partam.”
Ora a verdade é que não me veio nada mais interessante para dizer. Até porque ela já me conhece suficientemente bem para eu lhe poder enfiar uma peta de primeiro encontro. Mesmo assim, sem ter qualquer outra hipótese, tentei:
“Quando fui a Nova York pela primeira vez tinha havido um apagão. Andámos por ali sem ver nada. Já viste o que é estar numa cidade como Nova York às escuras? Nem queiras saber. Ouves os sons, sentes os cheiros, mas não vês nada. Tem tanto de assustador como de apaixonante. ”
Então ela parou de comer, pousou os talheres nos devidos lugares, fixou o olhar em mim. acabou de mastigar, limpou os lábios, dobrou o guardanapo e disse-me numa voz pausada e maternal:
“Precisamos, mesmo, de ter um filho.”

terça-feira, julho 12, 2005

É o maior

A carreira de Spielberg tem a mesma importância, para mim, que a do Nuno Gomes. Raramente fazem alguma coisa de jeito, mas quando o fazem tornam-se nos melhores do mundo.
Recordo, com saudade, os golos que a joaninha marcou à França, Inglaterra e Espanha e de como os mesmos me fizeram explodir de alegria. Mas, além destes raros momentos de inspiração, passo o resto do ano a chamar-lhe maricas e coisas bem piores que, para esta virtuosa página, pouca importância tem.
O mesmo se passa com o realizador americano. Não o chamo maricas, evidentemente, até porque o senhor não o parece, mas passo a vida a alcunhá-lo de piegas, vendido e, quando a prostituição é maior, judeu.
Spielberg foi o responsável por um filme que teve um efeito devastador em mim, tinha eu uns inocentes 15 anos. Império do Sol. Raramente encontro alguém que o tivesse visto, mas deu-me uma verdadeira lição sobre a linguagem cinematográfica e a consciência que na 7ªarte havia filmes e filmes.
Spielberg a partir de ontem tornou-se o melhor do mundo. Quem faz um filme como A Guerra dos Mundos tem de ser recordado para sempre. Se Spielberg tivesse uma camisola com o nome atrás, eu comprava-a. Se fosse jogador do Benfica fazia-me sócio já hoje.
Spielberg conseguiu meter-me medo. Durante duas horas andei de pestana aberta quase sem respirar e de coração acelerado. Apesar de ser um gajo a dar para o assustadiço, só alguns filmes me meterem vivo horror. Tirando os tradicionais que recorrem a técnicas de caracterização como o Exorcista e o recente Ju-on, acagacei-me vertiginosamente com os últimos 10 minutos do Blair Witch Project. Tirando estes exemplos, pautei-me sempre pela serenidade. Agora este Guerra dos Mundos é uma emoção constante que só Deus sabe.
Quando a projecção terminou, ainda a tremer, tive que mandar a namorada à frente para ver se estava tudo em ordem:
“Tá tudo bem, podes sair. É preciso essa fita toda? Mas obrigado me por mandares à frente, sei que contigo, em caso de guerra, posso sempre contar para me defenderes dos perigos.”
São mulheres, coitadas, não percebem as emoções da 7ªarte.
Agora, aviso já que o filme, ao contrário do que se possa pensar, não é exibido em ecrã total. O formato é minúsculo, tenho quase a certeza que a televisão da minha casa é maior que a área de projecção. Ainda assim, estranhando o facto, fui falar ao início com um dos empregados:
“Olhe que a projecção do filme está num tamanho minúsculo.”
“É mesmo assim. Ainda se diz você crítico de cinema...Realmente não percebe nada de nada. Não vê que é para sobressair a intensidade dramática....”
Mais descansado, voltei a sentar-me, mas sem antes ouvir o empregado cuspir entre dentes:
“Pató...”


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segunda-feira, julho 11, 2005

O estranho mundo de Hugo

Astuto como é meu apanágio ser, reparei durante os últimos dias uma certa estranheza que se evidenciava, matreira, na face da minha a namorada. Como sou homem habituado às manhas femininas, deixei-me andar como se nada tivesse acontecido, até porque mais cedo ou mais tarde havia de a apanhar de uma maneira sublime. Nada de perguntas, nem de insinuações, deixá-la andar, dar-lhe espaço. Quando elas escondem alguma coisa importante evidenciam um súbito e inexplicável acréscimo do trabalho doméstico. Por exemplo, já nem me lembro a última vez que tive de lavar a loiça e, digo com toda a honestidade, que só nos juntámos mediante a jura ao lema sagrado: “Eu faço o comer, tu lavas a loiça.”
Em situações semelhantes, onde o macho dominador pensa: “aqui há gato”, o melhor que tem a fazer é armar-se em estúpido, continuar a interessar-se por futebol e pelo fiel ou infiel. Uma mulher é como a equipa de futebol do Benfica, mais tarde ou mais cedo comete um erro e evidencia as fragilidades defensivas.
Maior estranheza senti ao vê-la a escrever, secretamente, num caderninho. Senti que a resposta aos meus anseios estava ali. Quando nos conhecemos, já lá vão 3 anos, ela disse-me que, por vezes, escrevia algumas considerações pessoais num pequeno livro. Eram, na verdade, confidências que tinha a intenção de enterrar, fechadas numa capsula, numa qualquer terra por onde passasse para, caso o destino o quisesse, serem desenterradas décadas mais tarde, quando o mundo se regesse por códigos morais diferentes. Na verdade, o objectivo era dar a conhecer a sua vida a uma qualquer pessoa do futuro.
Já se sabe, quando se conhece alguém, nos primeiros encontros, são sempre ditas enormidades de mentiras que tendem a impressionar o parceiro. Eu pelo menos sou assim. De forma que sempre julguei que aquela conversa fosse para eu a achar interessante e sensível.
Mas ao vê-la, recentemente, tão compenetrada num caderninho, e a escrever nele volta e meia, fez-me saltar a curiosidade. Vai daí esperei até que ela não estivesse em casa para o procurar. Desarrumada como é, não seria muito difícil dar com ele. Lá o encontrei numa das 100 malas de que é detentora. Abri:
Segunda Feira:
Manhã: 1 torradinha, 1 copo de leite e uma maçã
Meio da manhã: 1 iorgurte e 3 bolachas sem açucar
Almoço: 1 Sopa
Meio da Tarde: 1 iogurte e 3 bolachas sem açucar
Jantar: 1 dose de cereais light com leite

quinta-feira, julho 07, 2005

Já fizeram bem as contas?

Foi com desagrado que o gerente dum conhecido complexo de salas de cinema, ao qual me desloquei para ver o último filme de Spielberg, chegou perto de mim e disse:
“Oiça, você pode ir aonde quiser, mas aqui não entra. Não posso arriscar perder a receita de bilheteira por causa da sua vil presença.”
E na verdade tinha razão. Reparei que os clientes esperavam ansiosos que eu comprasse o meu bilhete para depois irem para as outras salas, evitando assim privarem comigo.
É por esta razão que não posso fazer a minha crítica sobre a tão esperada fita, Guerra dos Mundos. De forma que se o for ver e não gostar, já sabe que a culpa não é minha.
Mas em boa hora isto aconteceu. Foi um sinal divino porque, inesperadamente, comecei a pensar nos mistérios do universo e da busca do Homem em perceber os seus enigmas.
Convém dizer, que a acção de pensar foi retirada da minha vivência até há relativamente pouco tempo, porque uma besta dum psicólogo me encarou aos 12 anos, depois dum teste psicotécnico que fiz na escola secundária, e chutou: “Nunca vi uma coisa destas. É que pelos resultados, tu (na altura tratavam os putos na segunda pessoa do singular) não tens nem jeito para a matemática nem para as letras. Só te podes safar mesmo no desporto.” Ainda tentei fazer carreira na área, mas rapidamente comecei a ser conhecido pelo matraquilho de forma que me afastei da arte de bem dominar o esférico.
Passada esse trauma que durou 15 anos, pude então desenvolver uma curiosidade pela arte de ligar dois pensamentos seguidos.
Exemplo: Li há relativamente pouco tempo que um projéctil foi lançado duma sonda (Deep Impact) da Nasa e que colidiu de forma propositada com o cometa Tempel 1 a 37 mil quilómetros hora.. A notícia foi muito noticiada e até se viu o pessoal da Nasa aos saltos e aos gritos.
Agora, passado uns dias, dou de caras com um site que pretende, no dia 20 de Julho de 2006 juntar 600 milhões de pessoas em todo o mundo para saltarem em simultâneo a uma determinada hora. O objectivo deste mega-salto é conseguir que a Terra altere a sua órbita, afastando-se ligeiramente do sol. Este fenómeno terá, dizem eles, como consequência, a resolução parcial do aquecimento global. www.worldjumpday.org
A junção destas duas notícias leva-me a concluir: Queira Deus que não haja merda.

quarta-feira, julho 06, 2005

Papaver Somniferum Saltitantis

É oficial, Ronald Koeman ameaça deixar o Benfica antes de iniciar a temporada.
A notícia caiu que nem uma bomba no estágio que o Benfica, campeão nacional de futebol, iniciou na Suiça. Ao contrário das primeiras reacções do treinador da luz, que se mostrava muito impressionado com a receptividade dos emigrante lusos á sua nova equipa, o holandês tem vindo a demonstrar, nas últimas horas, algum incómodo por ter aceite o cargo. Nos bastidores, fala-se mesmo duma quebra de expectativa e duma desmotivação que vai crescendo com a passagem do tempo.
Os responsáveis encarnados têm agora duas preocupações para resolver. Dum lado Miguel, que teima em dar a conhecer o seu desinteresse em defender as cores da luz, por outro o súbito amuo de Koeman. Isto sem contar com os reforços que teimam em não vir.
Refira-se mesmo que Koeman não se mostra muito interessado em dirigir o treino de hoje e reivindicou que, ao fazê-lo, não entrará mais nos balneários onde a equipa habitualmente se equipa e cuida da higiene pessoal.
Pelo que o Desordem apurou, a razão deste estranho comportamento está no facto de Koeman ter pedido ao um dirigente para lhe traduzir o hino do clube, imortalizado por Luís Piçarra. Ora, tudo estava a correr bem até que o verso “São papoilas Saltitantes” ter sido proferido. Koeman tossiu comprometido e afastou-se de tudo e de todos sem dizer mais nenhuma palavra.
Efectivamente o verso “São papoilas saltitantes” é propício a mal entendidos, mas não se conhece, desde que Calado representou o clube, notícias que possam pôr em causa a masculinidade dos atletas, muito embora a preocupação de Nuno Gomes no cabelo suscite fundados preconceitos.A direcção vai ter uma reunião com o treinador para desfazer este mal entendido. Provavelmente a solução vai passar por uma alteração do hino.

terça-feira, julho 05, 2005

Importa-se de subir as calças

Para todos aqueles que confiavam no vosso editor e esperavam dele o melhor nesta última fase de exames, fiquem pois descansados que me portei à altura de tão altas expectativas.
Sempre eloquente e sabedor, com a concentração ao nível de qualquer campeão de xadrez dei, pois, o máximo que se exigia. A minha satisfação em alguns momentos foi tanta que consegui perfeitamente ouvir, na minha cabeça, aplausos cada vez que finalizava uma frase de efeito e começava um novo parágrafo. O alarido foi tanto que passei a noite a aspirinas. Cheguei a falar disso ao meu psicólogo, mas a resposta foi artificial: “É uma reacção perfeitamente natural. Normalmente, os parvos têm dessas coisas.”
Mas nem tudo foram rosas. Temo mesmo ter tramado a minha média com uma situação que, infelizmente, se vem tornando norma nas escolas portuguesas e para a qual ninguém parece interessado em resolver. Já tem feito mesmo correr alguns comentários entre os alunos, principalmente dos mais velhos que estão menos preparados para as mudanças súbitas de costumes e decoro.
Preparava-me eu para realizar aquela que era tida, por entre os especialistas, como a mais complicada e extenuante avaliação do ano, ainda para mais a ter lugar ás 8 da manhã quando, inocentemente, me deparo perante um cenário de sonho e destruição, que embora possa parecer, à primeira vista, um enorme paradoxo foi, na realidade, a mais pura das evidências.
Estava eu em plena labuta, dez minutos após o início do exame, quando uma colega, de bom porte, se fez sentar exactamente na cadeira em frente da minha. Fosse eu um cabulador de créditos firmados, viria isso como um sinal divino mas, ao invés, sendo eu aluno aplicado, pouca relevância teve.
“Até 1668, ano em que terminou a guerra da restauração, as dificuldades das pequenas cristandades africanas foram agravadas pela situação difícil que se vivia no reino…”
Foi aí que tudo descambou para a mais pura e ímpia das loucuras. Olhei eu para o vazio, procurando a inspiração que necessitava para a continuidade da frase, quando os meus olhos chocaram, sem piedade, com duas nádegas da rapariga que em má hora se sentou à minha frente e que já se debruçava, com devoção, no exercício proposto “Explique, de forma desenvolvida, a cristianização portuguesa em África.”.
A ganga descaída e um leve fio de tecido a que chamam fio dental trataram de me levar a concentração para outros pensares que em nada tinham a ver com a cristianização africana iniciada pelos nossos homens do clero. Esbugalharam-se os olhos que a terra me há-de levar ou queimar, dependendo da opção dos que cá ficam, e luxuriosamente se prostraram em tal imagem. Eu bem que quis continuar a desenvolver a resposta, ciente das minhas obrigações académicas, mas tal não foi possível, a única coisa que conseguia fazer era olhar para os atributos bem realçados do traseiro da frente. Esforcei-me em dar outro ânimo ao meu ardor intelectual, mas qual quê, a única coisa que lhe interessava verdadeiramente eram as cambalhotas que teimava em dar, mesmo sabendo que estava no corpo dum homem comprometido e sério.
“Tal como nos rios da Guiné, no futuro território de Moçambique a acção dos missionários foi determinante…cambalhotas e mais cambalhotas…”
“As missões em África circunscreviam-se em 1700 quase só sob os domínios lusos. A coroa portuguesa não tinha recursos humanos e financeiros para suportar…cambalhotas a toda a superfície do imaginário…posições de Yoga...”
Fechei os olhos e era como se os tivesse abertos, tudo o que conseguia ver eram as nádegas travessas da aluna.
“Foi em África que se iniciou e que findou a expansão; daí que a história das missões neste continente seja mais longa do que a referente a outras regiões…mortais, espargatas e piruetas…”
Passado um longo sonho em tons afrodisíacos, o meu espírito foi acordado pela voz do professor:
“Quê?!?! Duas horas e ainda só escreveu isso?! Tenha paciência! Daqui a dez minutos acabo o teste.”

segunda-feira, julho 04, 2005

Lua de mel, lua de fel

Para que não digam que o Desordem é um blog insensível em relação à felicidade das pessoas e que se tornou contrário aos aspectos positivos da vida, nomeadamente no que concerne ao embrutecimento do matrimónio e ao delírio da maternidade, deixo-vos então aqui a prova do contrário.
Casou há coisa de duas semanas a minha querida colega de trabalho Ana Rita. Já se tinha notado uma felicidade desmedida durante os dias que antecederam a cerimónia, ao ponto de toda a gente concordar que parecia ter rejuvenescido dois anos. Eu, mestre conhecedor dos fenómenos humanos, sempre disse que a sua felicidade vinha dos dias de férias extra que iria ter e não propriamente da troca de alianças. Vieram logo as vozes da sabedoria confrontar: “Ai, que és um estúpido, um bruto, uma besta...”

Pois bem, não sei que raio de amigos é que ela foi arranjar, mas quando chegar hoje da sua lua-de-mel, às quatro da manhã, vai-se deparar com um cenário pouco digno e pelo que ouvi dizer, e apesar de ser uma mulher de paciência de santa, muitos vão ser os vocábulos de má fama que os vizinhos vão poder escutar noite adentro.
Cara Rita, para que depois não digas isto e aquilo de mim, se por um acaso do destino resolveres abrir as páginas deste extraordinário blog quando aterrares em Lisboa, podes então encontrar todas as informações que necessitas para teres uma noite de descanso. O que prova que eu e o Desordem cada vez mais, constituímos um contributo ímpar na felicidade e bem-estar dos nossos queridos leitores.

Assim:
- Os bicos do fogão estão na caixa do correio do vizinho do 3ºD
- Os lençóis estão enxarcados em pimenta
- O saleiro de sal de mesa está com açúcar e o açucareiro com sal fino
- O pneu do carro está esvaziado e o sobresselente está escondido no meio da roupa, no armário maior.
- Todas as lâmpadas da casa foram retiradas dos candeeiros e perversamente escondidas atrás da porta da rua, pelo que aconselho vivamente a, quando chegares, não a abrires com demasiada força
- O comando da televisão está no motor do carro
- O gato está fechado no tambor da máquina de lavar. Não te preocupes que vai ser lá posto hoje ao fim da tarde, pelo que é natural que sobreviva.
- O código do alarme de casa foi alterado. Terás, para o silenciar, de lhe somar 10 valores aos do código antigo.

Apesar de teres o telémovel desligado, o que até compreendo visto estares a gozar as tuas merecidas férias, enviei-te uma mensagem a aconselhar-te a consultar o Desordem antes de chegares a casa. Para o teu bem, espero que, pela primeira vez, me leves a sério.